Criptoativos: Quais as alterações que se vão assinalar em Portugal?
De acordo com a proposta de Orçamento de Estado para 2023, o Governo Português propõe a tributação de rendimentos provenientes de transações de criptoativos como rendimentos empresariais e profissionais ou como ganhos de capital.
O que são criptoativos? E que impacto poderão ter na tributação pessoal?
Criptoativos são representações digitais de valores ou direitos que podem ser transferidos e mantidos eletronicamente. Embora sejam utilizados como método de pagamento, , os criptoativos são utilizados como ativos de investimento com frequência pelo facto de o seu valor flutuar bastante.
Os criptoativos e as criptomoedas não são sinónimos, uma vez que as criptomoedas são uma categoria de criptoativo.
Quais são as principais categorias de criptoativos?
Uma criptomoeda é uma moeda digital utilizada como meio de aquisição de bens e serviços, podendo também ser utilizada para investimento. A Bitcoin, a primeira cripotmoeada criada, a Ethereum, a Litecoin ou a Ripple são alguns exemplos de criptomoedas.
As Stablecoins são cripotmoedas associadas a um determinado ativo, de forma a controlar a sua volatilidade. As Stablecoins podem ser associadas a outra criptomoeda, a uma moeda fiduciária, a metais preciosos ou a commodities.
Os NFT (Non-fungible tokens ou tokens não fungíveis) são ativos digitais únicos, semelhantes a peças de arte. Quando se adquire um NFT, os mesmos equivalem a um certificado digital de propriedade. Ao contrário das criptomoeadas, os NFT’s, pelo facto se serem únicos, não podem ser permutados por outros NFT’s.
Criptomoedas
Algumas das caraterísticas das criptomoedas são:
- Serem descentralizadas – o que significa que não são controladas por entidades financeiras, governos ou pessoas.
- Não carecem de intermediários para serem transacionadas.
- Todas as transações alguma vez realizadas por utilizadores são registadas anonimamente no blockchain de transações.
- Transações seguras – Todas as transações são verificadas através de cálculos matemáticos realizados no blockchain de transações e apenas após essa verificação é que a transação é finalizada;
- Custos de transação baixos – Os custos de taxas de transação são muito reduzidos, sendo que o utilizador pode escolher pagar uma taxa diferente, por forma a acelerar a transação.
- As criptomoeadas podem ser trocadas, de forma simples, por moeda corrente, dada a sua elevada liquidez Apesar desta facilidade, a maioria dos bancos ainda não permite trocas, depósitos ou levantamentos.
- Até ao momento, é necessário recorrer a entidades corretoras para conseguir comprar, vender e transacionar criptomoedas. Algumas das corretoras mais populares são a Binance, Kraken e Gemini.
O Blockchain
O Blockchain é uma rede de computadores, na qual cada utilizador tem uma lista de “blocos” com todas as transações realizadas. Quando uma nova transação é criada, a mesma é validada por todos os computadores da rede e, quando aceite, a lista é atualizada para todos os utilizadores, como se tratasse de uma “assinatura digital”.
Em termos de segurança, toda a informação é encriptada na rede e não é possível aceder a informação privada dos intermediários de cada transação, embora seja possível consultar publicamente todas as transações.
Quando uma transação de criptomoedas é concretizada, e embora seja um ativo digital, é sempre enviada a original e não uma cópia, ao contrário do que acontece na Internet convencional.
Apesar de as criptomoedas serem a vertente mais conhecida do Blockchain, esta tecnologia pode ser aplicada em vários outros setores, como online hosting, serviços de Cloud e até uma Internet alternativa. Além do campo financeiro, outros campos como a medicina estão a investir na utilização de Blockchain, em grande parte devido à velocidade de processamento, que permite a aceleração de investigação médica.
De momento, caso o rendimento obtido por venda de criptomoedas constitua rendimento empresarial ou profissional com caráter habitual, então o rendimento estará sujeito não só a tributação como ao preenchimento obrigatório da respetiva declaração de imposto.
De acordo com a proposta de alteração legislativa ao regime da tributação dos criptoativos em Portugal, rendimentos não considerados como profissionais ou empresariais, resultantes da venda de criptoativos que não constituam títulos de capital, serão considerados rendimentos de capital, em que o rendimento sujeito a IRS será igual à diferença entre o valor da venda e o valor de aquisição, líquido da parte qualificada como rendimento financeiro, caso exista. No entanto, mesmo dentro do âmbito de rendimentos de capital, nem todos os rendimentos de criptoativos serão tributáveis, sendo que a intenção da proposta legislativa diz respeito a rendimentos de curta duração, o que justifica o porquê de a proposta não prever tributação sobre rendimentos obtidos por criptoativos detidos por mais de 365 dias ou mais. Para efeitos de contagem de prazo, a proposta prevê uma norma transitória, de acordo com a qual o período de detenção dos criptoativos adquiridos antes da entrada em vigor da lei contará para efeitos de prazo de detenção.
Os rendimentos provenientes de criptoativos poderão ser tributados como rendimentos empresariais. Operações relacionadas com a emissão de criptoativos, incluindo mineração ou validação de transações por meio de mecanismos de consenso, serão consideradas como atividades empresariais.
Além disso, caso sejam obtidos por um contribuinte em regime de tributação simplificada, a proposta estabelece que o coeficiente aplicável a este tipo de rendimento, para a determinação da matéria coletável, é de 15%, uma vez que se pretende que os criptoativos sejam incluídos no conceito de “venda de bens e produtos”.
Sublinhamos também que a proposta estabelece novas obrigações declarativas, diretamente aplicáveis às transações de criptoativos. Assim, pessoas singulares e coletivas, organismos e entidades sem personalidade jurídica, que forneçam a detenção de criptoativos e serviços administrativos em benefício de terceiros ou que detenham a gestão de uma ou mais plataformas de transação de criptoativos, deverão comunicar à Autoridade Tributária e Aduaneira, até ao final do mês de janeiro de cada ano, as transações realizadas com a sua intervenção, por cada contribuinte.
Por último, devemos referir-nos ao Imposto de Selo, uma vez que os intermediários financeiros serão tributados sob este imposto, de acordo com a proposta legislativa, não sendo tributados em IVA. Em relação a este ponto, por um lado, os criptoativos são considerados como transmissões gratuitas, sujeitas à tributação prevista no artigo 1.2 da Tabela Geral de Imposto de Selo, enquanto representações digitais de valores ou direitos que podem ser transmitidos ou armazenados eletronicamente, utilizando tecnologia de registo ou similar. Por outro lado, os fornecedores de criptoserviços serão tributáveis em Imposto de Selo em transações relacionadas com comissões aplicadas por ou através desses fornecedores (futuro artigo 30 da Tabela Geral de Imposto de Selo), a não ser que os fornecedores não sejam domiciliados em Portugal. Neste caso, os indivíduos tributáveis serão os fornecedores com domicilio em território nacional que tenham intermediado as operações, ou ainda os representantes que, para o efeito, tenham sido mandatados em Portugal, caso as operações não tenham sido intermediadas pelas entidades supramencionadas.
Da mesma forma, o novo regime esclarecerá se o ónus do imposto recairá sobre o cliente das operações realizadas por ou com a intermediação de um prestador de serviços de criptoativos.
No que respeita à tributação, nos termos da proposta apresentada, as referidas operações estarão sujeitas a uma taxa de imposto de 4%, em linha com a generalidade das operações financeiras sobre o valor arrecadado. Esta responsabilidade fiscal deve ser considerada como originária no momento da cobrança das comissões e outras contraprestações. Neste contexto, o imposto é devido sempre que o prestador de criptoserviços, ou o cliente desses serviços, esteja domiciliado em território português, sendo considerado domicílio a residência, sede, direção efetiva, filial, sucursal ou estabelecimento estável.
Relativamente às transferências gratuitas, conforme referido anteriormente, os criptoativos estarão sujeitos a imposto ao abrigo do ponto 1.2 da TGIS, sem prejuízo da isenção prevista no Código do Imposto de Selo. Neste contexto, o imposto apenas é devido quando os bens se encontrem em território português, razão pela qual passa a prever-se que os valores monetários e criptoativos depositados em instituições com sede, direção efetiva ou estabelecimento estável em território português sejam considerados como estando localizados em território português. E, quando não sejam depositados valores monetários ou criptoativos, consideram-se localizados em território português nas sucessões por falecimento quando o cedente estiver domiciliado em Portugal, e nas outras transferências gratuitas, como doações, quando o beneficiário for domiciliado em Portugal.
Refira-se ainda que, para efeitos de transmissões gratuitas de criptoativos, o valor tributável é determinado aplicando-se, em primeira opção, as regras específicas do Código do Imposto de Selo ou, sequencialmente, pelo valor da cotação oficial, se existir, e, por fim, pelo valor declarado pelo casal ou pelo beneficiário, que deve, na medida do possível, aproximar-se do valor de mercado. Nesta última situação, quando a Autoridade Tributária e Aduaneira considerar, justificadamente, que pode existir divergência entre o valor declarado e o valor de mercado, tem competência para determinar o valor tributável com base no valor de mercado.
Conclusões
O Blockchain trouxe muitas inovações tecnológicas, e muitas mais acontecerão no futuro. As criptomoedas, por sua vez, vieram mudar completamente o cenário financeiro e, embora ainda seja um mercado com muita volatilidade e não regulamentado, existe uma grande aposta no mesmo. El Salvador, tornou-se o primeiro país do mundo a reconhecer a Bitcoin como moeda de troca legal e o Banco Central de Portugal já legalizou duas corretoras de criptomoedas no país. Além disso, muitos comerciantes nacionais e internacionais já aceitam criptomoedas como forma de pagamento.
O modelo português de tributação de criptoativos acaba por se aproximar do modelo fiscal alemão, embora não elimine totalmente os benefícios fiscais, já que garante isenção fiscal para ativos detidos por períodos superiores a 365 dias. De facto, centra-se na tributação das mais-valias sobre ativos de curta duração, aplicando uma taxa de 28%, que já existe no sistema fiscal português para outros tipos de mais-valias.
Adicionalmente, será eliminada a inexistência de regras de incidência e será estabelecido o regime legal de tributação dos intermediários, em matéria de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares e Imposto de Selo, onde será estabelecida uma taxa de 4%, bem como o regime fiscal para a tributação desses bens em transferências livres.
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